
Indicado para representar o país na cerimônia do Oscar, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho prova que a simplicidade ainda é a melhor receita para o sucesso. Curiosamente, me confessa o diretor estreante Daniel Ribeiro que o título provisório do longa era “Todas as Coisas Mais Simples”.
Bati um papo com ele no salão de chá do May Fair Hotel, num dos endereços mais “posh” da capital, para compartilhar com ele a sua estupefação diante do rumo que o filme está tomando: “No Festival de Berlim, vendemos para 14 países; hoje já são 22 países (com os direitos de distribuição comprados). A gente não esperava, porque é um filme simples, com uma temática social”. Continuo: “E como é que vocês foram parar lá?” “Desde o início Diana (Almeida, a produtora) mandou a vários agentes de vendas internacionais o roteiro. No começo, alguns se interessaram, mas não deram grana. Quando fizemos o primeiro corte, mandamos para a Alemanha.” E conclui que: “Foi fácil. Hoje em dia tem muito mais incentivo do que antes. A gente ganhou vários editais nacionais.” Insisto: “Fácil como? Quanto tempo demorou da pré-produção até o final cut?”. “Um ano.”
É um milagre? Não, claro que não. Daniel tem a sensibilidade de tratar de temas que estão intrinsecamente ligados à sua vivência. “Se você vai contar uma história, é melhor saber sobre o que você está falando.” Esse foi exatamente o conselho que Cassavetes deu ao estreante Scorsese, logo depois de ele ter negligenciado suas raízes na Little Italy de Nova York e se aventurado a fazer um western em Hollywood. No terceiro filme, ele voltou à mafiazinha, aos conflitos católicos e a low life. No caso de Ribeiro, é a autodescoberta feita por um adolescente homossexual. “Ah, não era para ele estar se questionando, ‘e aí? O que vai ser agora?’ Era para ser algo natural”. É justamente esse aspecto de naturalidade que distingue Hoje Eu Quero Voltar Sozinho dos outros filmes.
Então, para quem ainda não sabe, o enredo conta a história de um adolescente cego, Leonardo (Guilherme Lobo), que passa a maior parte do tempo com sua melhor amiga Giovana (Tess Amorim). Até que um outro jovem, Gabriel (Fabio Audi), se matricula na escola que os dois frequentam e vem para balançar este equilíbrio.
Irremediavelmente otimista, Ribeiro solta que, em relação aos direitos adquiridos pelos homossexuais no Brasil, a situação melhorou sensivelmente nos últimos dez anos. “Mas ainda é preciso lutar muito. Eu sou daqueles que prefere reparar na metade do copo que está cheia.” Retruco: “Mas ainda precisamos de filmes e figuras políticas como Milk (interpretado por Sean Penn)!”. “Sim, o Brasil precisa de 30 Jean Wyllis.”
Pendendo entre os ideais de liberdade e felicidade, “Hoje eu quero voltar sozinho” torna-se, portanto, um cinema de alegria genuína, humor e charme. De uma leveza própria dos jovens, algo que pouco se vê nas artes brasileiras, onde, por vezes, há certa pretensão de mostrar tudo o que se sabe esteticamente na primeira obra. Ribeiro vai por outra trilha, pegou um atalho e nossa! está encantando por aqui.
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro (Brasil, 2014)

Veja a cobertura completa do London Film Festival 2014